By Antonio Gomes
Uma ladeira estreita de passar um veículo, noite chuvosa e fria! À nossa frente, um caminhão de coleta de lixo parado não deixava espaço nem para uma mosca. Nós, eu no meu carro e o taxista logo à frente, esperávamos o trabalho dos coletores.
Estávamos impressionados! Cada coletor fazia serviço de dois homens, - ou de dez? - colhendo aos montes sacos de lixo de um condomínio aqui, depois de outro ali e logo corriam mais à frente. Outros tantos sacos das residências ao lado. Na sequência, colhiam de um outro prédio... E assim iam, muito dedicados, ensopados e dando duro. Mas o caminhão, parado, não rendia centímetro no percurso. Impedindo passagem... Fazer o quê!
O taxista parecia cantarolar algo animadamente, paciente. Eu, bem cansado – tive um dia corrido pacas - também esperava, na minha. Atrás de nós a fila de carros aumentava.
De repente, uma buzina desrespeitou o silêncio!
Eu e o taxista nos fizemos de surdos – ao menos eu me fiz – sabe-se lá se alguém teria esbarrado no botão. Era evidente que o esforço daqueles trabalhadores subindo ladeira, debaixo de chuva, naquela rapidez! Era algo a ser admirado qual um concerto de Mozart: em respeitoso silêncio!
Mas nem tão de repente, nem casual, ouvimos outra buzina...
E os coletores voavam pelas calçadas cobertas de imundos sacos pretos, jogando o que podiam dentro do caminhão, quase se jogando sobre os restos da cidade, que, lógico, não podia parar um minuto...Corriam desesperados, mas alguns até sorriam durante a labuta. Impressionante!
Mais uma buzina e pronto! O taxista - um brutamontes de sensatez - colocou o rosto pela janela e olhou para trás impaciente. Olhei para ele, também inconformado. Afinamos-nos
- Quem diabos teria tido a coragem de buzinar contra aqueles caras? – Adivinhei seu pensamento.
Outra buzina foi o suficiente!
O taxista, um senhor mais gordo, esforçava-se por sair do táxi... Quando percebi, eu também estava abrindo a porta do meu carro e, do alto dos meus um metro e sessenta e poucos de imponência masculina, ao lado da porta, gritei pro mundo!
- Olha a falta de respeito com o trabalhador! Ou alguém aí tá a fim de ajudar a pegar lixo?
Percebi que funcionou, aliás, mais do que esperava, quando, olhando para trás, descobri o motivo! O taxista fazia às vezes de um guarda costas – e de respeito! – e ele emendou:
- Seu bando de lixo!
Não podia ser melhor! Chovia forte. Mas, naquele instante, qualquer um conseguiria ouvir cada gota de chuva que caia ao chão. A cidade literalmente se calou!
De repente, intuí exatamente onde estava a imundice dessa cidade e não era entre seus coletores e nem dentro dos sacos pretos que carregavam; nem mesmo nos aterros sanitários. O lixo maior dessa urgente capital está na prevalência daquilo que é particular sobre o que é de interesse público... A mais abjeta falta de respeito à coisa pública era, e ainda é, o que mais fede, nessa, que é uma das maiores urbes da América neo libertina!