quarta-feira, 17 de julho de 2013

Três Mil


Brian estava  contente com seu novo trabalho. Havia sido contratado há um mês para o cargo de Analista Comercial Pleno II e meio pela Lim Sêrt Company, com salário de três mil reais, seu maior salário até então.

Certo dia, enquanto tomava um café na copa, a auxiliar de limpeza Diana lhe perguntou se ele poderia ajudá-la a fazer seu imposto de renda, já que ela não sabia mexer direito no computador. Brian ficou surpreso:

- Imposto de renda? Posso... mas acho que você não precisa declarar.

- A menina do RH disse que eu preciso sim, porque tem um dinheiro lá para eu resi... restu... res... ah, pra eu pegar de volta.

- Desculpe-me pela pergunta Diana, mas quanto você ganha?

- Ganho três mil.

Brian engasgou com o café. Nem terminou a conversa com Diana e subiu, com o peito estufado, para conversar com o diretor.

- Doutor Severino, posso conversar com o senhor um minuto?

- Sim, sente-se.

- É que eu acabei de descobrir que a moça da limpeza ganha três mil.

- E?

- E eu também ganho três mil.

- E?

- E não me parece justo.


- Não estou entendendo Brian. Quando você se candidatou, disse que queria o cargo de Analista Comercial Pleno II e meio, por isso foi contratado para este cargo. Se você tem interesse no cargo da Diana, nós temos ainda uma vaga aberta para aquele cargo. Você pode fazer os testes e estando apto, dou preferência pela sua transferência em vez de contratarmos alguém de fora.

- Não doutor, não é isso. Posso te fazer uma pergunta?

- Já fez, mas pode fazer outra.

- Quanto o senhor ganha?

Severino pegou seu holerite e mostrou a Brian. Brian riu desconfiado:

- Está faltando um zero aqui, não está?

- Não Brian. Aqui todos ganhamos três mil.

- Mas e os sócios?

- Somos só dois sócios, o Cícero e eu. Ele também ocupa uma diretoria e também ganha três mil. Aqui ninguém ganha sem trabalhar.

- Mas o senhor acha justo isso? Vi que o senhor fez MBA fora do país. Acha justo ganhar o mesmo que a Diana?

- O que você estava fazendo em 2006, Brian?

- Eu era estagiário na Sotnec  Sies.

- Então, 2006 foi o ano que eu fiz meu MBA. Também foi o ano que você trabalhou como estagiário na Sotnec  Sies. Foi o ano em que Diana nem conseguiu trabalhar porque estava cuidando da mãe doente. Percebe que todos nós fizemos coisas em 2006? Percebe nossas escolhas de acordo com nossas oportunidades?

- Percebo, mas continuo achando tudo isso muito estranho. Meu salário então sempre será três mil?

- Não, não. Se conseguirmos aumentar nosso faturamento e consequentemente nossa lucratividade, ano que vem você terá um salário maior.

- Só eu?

- Sim. Só você. Só eu. Só a Diana. E só todos os funcionários.

- Mas isso é desestimulante. A vontade que eu tenho sabendo disso é de sentar na minha mesa e não fazer mais nada. Pra que vou me dedicar?

- Olha Brian, você nos procurou dizendo que sabia e que gostava de atuar nesta função. Você tem uma descrição de cargo muito clara, com todas as atividades a serem desempenhadas. Se você não as realizar, é muito simples, você será demitido.

- Mas o que move as pessoas a crescerem aqui dentro?

- Isso você pode perguntar a cada uma delas.

- Só mais uma pergunta: o motoboy também ganha três mil?

- Não. O motoboy ganha mil e quinhentos.

- Ahhhhhhhh... sabia que tinha alguma coisa estranha.

Severino sorriu:

- Mas ele só trabalha meio período.